Israelismo Britânico
A origem doutrinária da Mensagem de William Branham
Você sabia que a crença em um “Elias vindouro” e a doutrina da “semente da serpente” possuem uma raiz comum? Ambas derivam do chamado Israelismo Britânico.
O que é Israelismo Britânico?
O Israelismo Britânico, também conhecido como anglo-israelismo, foi um movimento pseudocientífico, pseudoarqueológico e pseudorreligioso que surgiu no final do século XVIII, no Reino Unido. Seus adeptos acreditavam que o povo anglófono das Ilhas Britânicas era, na verdade, descendente direto das dez tribos perdidas de Israel.
O rei Jaime I (o mesmo da famosa tradução da Bíblia King James) foi um dos primeiros promotores dessa ideia, por acreditar ser descendente do rei Davi.
O conceito foi posteriormente sistematizado por John Wilson no início do século XIX. Autoproclamado linguista, Wilson sustentava — sem qualquer respaldo acadêmico — que a língua inglesa teria evoluído diretamente do hebraico antigo. Suas ideias foram totalmente refutadas por linguistas respeitáveis.
Wilson uniu-se a Charles Piazzi Smyth, astrônomo e arqueólogo vinculado à Royal Society, que se tornou o principal divulgador da piramidologia. Smyth afirmava que a Grande Pirâmide de Gizé teria sido construída por Enoque antes do dilúvio e que nela existiria uma geometria sagrada capaz de prever eventos futuros, inclusive o fim dos tempos. Para Smyth, a pirâmide e o zodíaco eram uma espécie de “Bíblia primitiva” da era antediluviana.
A união das ideias de Wilson e Smyth fundiu o Israelismo Britânico com a piramidologia, formando uma ideologia sincrética e complementar, consolidada em meados do século XIX.
Jane Lead e Joanna Southcott
Jane Lead (1624–1704), autoproclamada profetisa, liderou um renascimento de tendências gnósticas na Inglaterra do século XVII. Fundou a Sociedade da Filadélfia, onde difundiu suas doutrinas, conhecidas posteriormente como “A Mensagem”. Em um de seus escritos mais conhecidos — contendo sessenta proposições —, Lead afirmava que, nos últimos dias, a Igreja receberia o retorno de Elias para revelar mistérios ocultos desde a antiguidade. Ela relacionava essa revelação aos sete selos e sete trovões do Apocalipse.
Joanna Southcott (1750–1814), que também se autodeclarou profetisa, deu continuidade às ideias de Lead. Southcott afirmava que a manifestação do “verdadeiro Israel” seria um sinal da iminente volta do Messias. Uma enfermidade abdominal provocou inchaço em seu ventre, levando seus seguidores a acreditarem que ela estaria “grávida do Messias” e a identificarem-na com a “mulher de Apocalipse 12”. Southcott, no entanto, faleceu em 1814 sem que tais expectativas se cumprissem.
John Alexander Dowie
John Alexander Dowie (1847–1907), escocês adepto do Israelismo Britânico, teve contato na juventude com a Igreja Cristã Católica Apostólica, fundada por Edward Irving. Nesse ambiente, absorveu tanto o Israelismo Britânico quanto a doutrina do “ministério dos cinco retornos de Elias”.
Mais tarde, já nos Estados Unidos, Dowie iniciou seu ministério em São Francisco e depois ficou famoso em Chicago como pioneiro das campanhas de cura divina. Inicialmente, ensinava apenas que Elias retornaria para preparar a Igreja para o Milênio. Com o tempo, passou a autoproclamar-se o “terceiro retorno de Elias”, adotando vestimentas simbólicas — túnica e cajado — para reforçar sua imagem profética.

Durante seu ministério, Dowie convenceu seus seguidores de que, para o Milênio ser estabelecido, seria necessário edificar uma “Sião” terrena. Assim surgiu Zion City, no estado de Illinois (EUA), inicialmente concebida como uma comunidade autossuficiente e fechada. Além de residências, a cidade possuía banco próprio, no qual todos os recursos dos fiéis foram investidos, e um Tabernáculo Cristão Católico e Apostólico, onde Dowie ensinava suas doutrinas particulares.
Entre essas doutrinas estavam:
- o Israelismo Britânico, segundo o qual apenas os descendentes das tribos perdidas de Israel eram os filhos de Deus e seriam salvos;
- a crença de que Dowie era o profeta Elias prometido em Malaquias 4:5;
- cura divina e confirmação positiva, acompanhada de completo desprezo pela medicina tradicional.
Dowie governou Zion City de forma autoritária, utilizando seu poder como proprietário das terras para controlar rigidamente os moradores. O comércio era monopolizado por ele, e os habitantes eram obrigados a comprar e vender apenas nas lojas sob seu domínio. O uso de medicamentos e hospitais era proibido, restando apenas a oração pela cura — o que resultou em diversas mortes por falta de tratamento médico.
Após sofrer um derrame que o incapacitou, a liderança de Dowie entrou em colapso, revelando o mau uso dos recursos financeiros da comunidade. Muitos seguidores perderam todo o patrimônio investido, já que Dowie administrava os fundos de maneira arbitrária e sem qualquer limite.
A teoria das duas sementes
Desde os primórdios do Israelismo Britânico, circulava a crença em “duas sementes”:
- uma genealogia justa (associada aos britânicos ou anglo-saxões),
- e uma genealogia corrupta (associada a outros povos e etnias).
Com o tempo, essa doutrina assumiu caráter racial, promovendo a preservação da suposta “pureza de sangue” e defendendo a segregação racial.
Russell Kelso Carter — adepto do Israelismo Britânico e autor do hino Standing on the Promises of God (Firme nas Promessas, presente na Harpa Cristã) — reinterpretou a narrativa do pecado original. Ele ensinava que Eva teria tido relações sexuais com a Serpente no Éden, originando Caim, uma “prole híbrida” literal, descendente de Satanás. Carter associou essa linhagem às raças não brancas, dando à doutrina caráter fortemente discriminatório.
O Elias vindouro
A expectativa de um “Elias dos últimos dias” não era interpretada como promessa aos gentios, mas aos supostos descendentes das dez tribos perdidas — isto é, ao “verdadeiro Israel”. Assim, acreditava-se que apenas um profeta israelita para um povo israelita poderia cumprir tal profecia.
Diversos líderes, antes de Branham, ligados ao Israelismo Britânico reivindicaram ser esse Elias:
- Frank Sandford,
- John Alexander Dowie, que reforçava a imagem profética usando manto e cajado,
- Charles Parham e William Seymour, figuras centrais do pentecostalismo inicial.
William Branham e a sua Mensagem
William Branham entrou em contato com o Israelismo Britânico por meio de Roy Davis e Gordon Lindsay.
- Roy Davis seguia uma vertente radical do Israelismo Britânico chamada Identidade Cristã, que defendia segregação racial e, muitas vezes, recorria à violência e terrorismo, por meio de grupos como a Ku Klux Klan. A famosa doutrina branhamista da “Semente da Serpente” deriva desse ambiente ideológico.
- Gordon Lindsay, administrador das campanhas de Branham na década de 1940, tinha ligação com Zion City — seus pais congregavam na igreja fundada por Dowie. Branham pregou no Tabernáculo de Sião e, após essas visitas, começou a se autoproclamar profeta à semelhança de Elias, chegando a afirmar falsamente que Dowie teria profetizado a seu respeito.
21 “Como o Dr. Dowie, em sua morte, profetizou que eu viria àquela cidade quarenta anos após sua morte. Sem saber de nada, ele morreu em um dia e eu nasci no seguinte. E quarenta anos depois, entrei na cidade, sem saber de nada. Oh, como o grande mover de Deus está se concretizando. Ouço o som de chuva abundante”.
51-0929 — Nossa Esperança Está em Deus (Our hope is in God)
Rev. William Branham
Porém, há um problema factual:
- Data considerada correta do nascimento de Branham: 6 de abril de 1909.
- Data da morte de Dowie: 9 de março de 1907.
Para que a profecia fosse verdadeira, Branham teria que ter nascido em 10 de março de 1907, o que não corresponde ao que ele comumente declarou.
Além de advogar pelo retorno de Elias, Branham afirmou, em 1965, que o Elias dos últimos dias se configuraria como uma manifestação divina em forma humana. Tal concepção aproxima seus ensinamentos das crenças de Joanna Southcott e de seus seguidores, que sustentavam a ideia de que o Messias se encarnaria novamente no fim dos tempos.
212 - Agora, tivemos Elias, e as túnicas de Elias, e os mantos de Elias, e tudo de Elias. Mas o Elias deste dia é o Senhor Jesus Cristo. Ele virá, de acordo com Lucas 17:30 é que o Filho do Homem se revelará entre o Seu povo. Não um homem: Deus! Mas virá por meio de um profeta.
65-1127 Tentando fazer um serviço para Deus fora de Sua vontade
Rev. William Branham
Conclusão
William Branham foi diretamente influenciado pelos principais conceitos do Israelismo Britânico, o que moldou profundamente seus ensinamentos. Tanto a doutrina da Semente da Serpente quanto a crença em um Elias vindouro não são revelações inéditas de Deus, mas sim heranças ideológicas do final do século XIX e início do século XX. A “Mensagem” de Branham, portanto, não possui origem divina, mas é resultado da continuidade de doutrinas humanas e de interpretações distorcidas da Escritura.
Referências:
Sai dela povo meu, Vol I - Charles Paisley